domingo, 2 de dezembro de 2012

Poesia

Ultimamente, muitas coisas que não faziam sentido começaram a fazer, começaram a sentir.
Poesia...
As palavras explicadas são agora as que não fazem sentido.
Tudo o que era, já não é mais...
O último olhar atônito sobre as rosas.
A última rosa atônita sobre o olhar.
As rosas...
Os últimos...

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

SOU BONITO

Não é o meu costume ouvir música enquanto escrevo. Fico possuído pela música, numa espécie de êxtase, e isto faz parar meus pensamentos. Contrariando o meu hábito, coloquei no micro um CD de uma peça que nunca ouvira, a sonata para violino e piano de César Frank. Minutos depois eu estava chorando. Aí interrompi o choro e fiz um exercício filosófico. Perguntei-me: ” Por que é que você está chorando?”. A resposta veio fácil: “Choro por causa da beleza”…. Continuei: ” Mas o que é a experiência da beleza?”. Sem uma resposta pronta, veio-me algo que aprendi com Platão. Platão, quando não conseguia dar respostas racionais, inventava mitos. Ele contou que, antes de nascer, a alma contempla todas as coisas belas do universo. Essa experiência é tão forte que todas as infinitas formas de beleza do Universo ficam eternamente gravadas em nós. Ao nascer, esquecemo-nos delas. Mas não a perdemos. A beleza fica em nós adormecida como um feto. Assim, todos nós estamos grávidos de beleza, beleza que quer nascer para o mundo qual uma criança. Quando a beleza nasce, reencontramo-nos com nós mesmos e experimentamos a alegria. Agora vem a minha contribuição. Continuo o mito. Há seres privilegiados - eles bem que poderiam ser chamados de anjos - aos quais é dado acesso a esse mundo espiritual de beleza. Eles vêem e ouvem aquilo que nós nem vemos nem ouvimos. Aí eles transformam o que viram e ouviram em objetos belos que os homens normais podem ver e ouvir. É assim que nasce a arte. Ao ouvir uma música que me comove por sua beleza, eu me re-encontro com a mesma beleza que estava adormecida dentro de mim.

Rubem Alves - Ostra feliz não faz pérola

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

"Conheço de Palma os Dementes de Rio
Fui amigo do Bugre Felisdônio, de Ignácio Rayzama
e de Rogaciano.
Todos catavam prego na beira do rio para enfiar
no horizonte.
Um dia encontrei Felisdônio comendo papel nas ruas
de Corumbá.
Me disse que as coisas que não existem
são as mais bonitas."

Manoel de Barros

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

PRECISO DE POESIA

Preciso de poesia na minha vida
Preciso de fé
Preciso de esperança
Beleza
Amor
Inspiração

Preciso acreditar novamente
Na fé
Na esperança
Na beleza
No amor
Na inspiração

Preciso de poesia
Preciso poetizar a vida....

domingo, 27 de março de 2011

Extremos da paixão


Não, meu bem, não adianta bancar o distante lá vem o amor nos dilacerar de novo...

Andei pensando coisas. O que é raro, dirão os irônicos. Ou "o que foi?" - perguntariam os complacentes. Para estes últimos, quem sabe, escrevo. E repito: andei pensando coisas sobre amor, essa palavra sagrada. O que mais me deteve, do que pensei, era assim: a perda do amor é igual à perda da morte. Só que dói mais. Quando morre alguém que você ama, você se dói inteiro(a)- mas a morte é inevitável, portanto normal. Quando você perde alguém que você ama, e esse amor - essa pessoa - continua vivo(a), há então uma morte anormal. O NUNCA MAIS de não ter quem se ama torna-se tão irremediável quanto não ter NUNCA MAIS quem morreu. E dói mais fundo- porque se poderia ter, já que está vivo(a). Mas não se tem, nem se terá, quando o fim do amor é: NEVER.

Pensando nisso, pensei um pouco depois em Boy George: meu-amor-me-abandonou-e-sem-ele-eu-nao-vivo-então-quero-morrer-drogado. Lembrei de John Hincley Jr., apaixonado por Jodie Foster, e que escreveu a ela, em 1981: "Se você não me amar, eu matarei o presidente". E deu um tiro em Ronald Regan. A frase de Hincley é a mais significativa frase de amor do século XX. A atitude de Boy George - se não houver algo de publicitário nisso - é a mais linda atitude de amor do século XX. Penso em Werther, de Goethe. E acho lindo.

No século XX não se ama. Ninguém quer ninguém. Amar é out, é babaca, é careta. Embora persistam essas estranhas fronteiras entre paixão e loucura, entre paixão e suicídio. Não compreendo como querer o outro possa tornar-se mais forte do que querer a si próprio. Não compreendo como querer o outro possa pintar como saída de nossa solidão fatal. Mentira:compreendo sim. Mesmo consciente de que nasci sozinho do útero de minha mãe,berrando de pavor para o mundo insano,e que embarcarei sozinho num caixão rumo a sei lá o quê, além do pó.O que ou quem cruzo entre esses dois portos gelados da solidão é mera viagem: véu de maya,ilusão,passatempo.E exigimos o terno do perecível,loucos.

Depois, pensei também em Adèle Hugo, filha de Victor Hugo. A Adèle H. de François Truffaut, vivida por Isabelle Adjani. Adèle apaixonou-se por um homem. Ele não a queria. Ela o seguiu aos Estados Unidos, ao Caribe, escrevendo cartas jamais respondidas, rastejando por amor. Enlouqueceu mendigando a atenção dele. Certo dia, em Barbados, esbarraram na rua. Ele a olhou. Ela, louca de amor por ele, não o reconheceu. Ele havia deixado de ser ele: transformara-se em símbolosem face nem corpo da paixão e da loucura dela. Não era mais ele: ela amava alguém que não existia mais, objetivamente. Existia somente dentro dela. Adèle morreu no hospício, escrevendo cartas (a ele: "É para você, para você que eu escrevo" - dizia Ana C.) numa língua que, até hoje, ninguém conseguiu decifrar.

Andei pensando em Adèle H., em Boy George e em John Hincley Jr. Andei pensando nesses extremos da paixão, quando te amo tanto e tão além do meu ego que - se você não me ama: eu enlouqueço, eu me suicido com heroína ou eu mato o presidente. Me veio um fundo desprezo pela minha/nossa dor mediana, pela minha/nossa rejeição amorosa desempenhando papéis tipo sou-forte-seguro-essa-sou-mais-eu. Que imensa miséria o grande amor - depois do não, depois do fim - reduzir-se a duas ou três frases frias ou sarcásticas. Num bar qualquer, numa esquina da vida.

Ai que dor: que dor sentida e portuguesa de Fernando Pessoa - muito mais sábio -, que nunca caiu nessas ciladas. Pois como já dizia Drummond, "o amor car(o,a,) colega esse não consola nunca de núncaras". E apesar de tudo eu penso sim, eu digo sim, eu quero Sins.

Caio Fernando Abreu

sexta-feira, 18 de março de 2011

Basta de injustiça, chega de exploração: MAMÃE, EU QUERO MAMAR!

Minha amiga, me faça um favor, ligue a tv, bote em qualquer canal e assista a uns três ou quatro anúncios, a umas duas ou três notícias. Pode ir que eu espero.

Foi? Agora me diga se eu estou errado. Nos anúncios as crianças agem como adultos e os adultos como crianças? Você viu um senador da república roubando descaradamente e defendendo até às lágrimas seu direito de roubar descaradamente? Viu um ministro lá do judiciário ganhando uns 20 mil, se aposentando com os 20 mil limpinhos e reclamando que não tem aumento? Viu milhões de pessoas vivendo numa favela, sem esgoto, hospital e escola, com tiroteio diário e todo mundo saindo de casa pra trabalhar em vez de sair pra tocar fogo na cidade inteira?

Bem, você e o resto da turma eu não sei, minha amiga, mas eu, diante disso tudo, eu pergunto: esses poderosos todos acham que vão me tratar feito criança e eu não vou fazer nada? Pois estão muito enganados! Eu vou fazer birra, vou fazer manha, vou fazer beicinho, vou deitar no chão e espernear! E não vou ficar calado não. Vou chorar bem alto: uééééé! E se você está estranhando, eu explico, minha amiga. É simples: está mais do que provado, está mais do que na cara que eu tenho a idade mental de um bebê. Que outra explicação pode haver para esse mundo ser esse mundo e eu não sair por aí incendiando tudo, como um descendente de Nero, ou cometendo uns três ou quatro genocídios, tal qual uma reencarnação de Átila, de algum papa ou do Stálin?

E já que eu não fiz nada disso, a partir de hoje eu exijo ser tratado como um recém-nascido, um lobotomizado. É, minha amiga, essa aqui é a Declaração Universal dos Direitos de um Zero à Esquerda. E o zero à esquerda sou eu, muito prazer. Chega de ser inocente útil. Eu quero ser um inocente inútil, improdutivo, imprestável e não ter mais responsabilidade nenhuma. Eu não quero saber de restaurante de um real nem de ticket-refeição: eu quero o governador em pessoa aqui em casa na hora do almoço fazendo “olha o aviãozinho” com a colher cheia de feijão. Eu não quero transporte público, eu quero que me levem no colo. Neném gosta é de colinho! É isso mesmo, o Brasil pode tratar de se apertar porque chegou mais um pra ficar deitado eternamente em berço esplêndido: eu! Podem me prender e até me torturar. Minhas únicas declarações serão: papá, mamã, dadi-dudi-dódó!

Mas não se assuste, minha amiga, porque eu também não sou nenhum revoltado inconsequente. De jeito nenhum! Tanto que prometo bater palminha pra todas as declarações dos poderosos. Podem mentir à vontade, podem até cair na gargalhada no meio de seus importantes pronunciamentos. Eu vou também vou rir. Nós, os bebês, somos assim: sempre que a gente vê um adulto rindo a gente ri junto.

E nunca mais vou recitar emocionado: Ah, que saudades que eu tenho da minha infância querida. Sabem por quê? Porque a minha infância querida só vai acabar quando eu morrer bem velhinho. E ainda estarei andando de carrinho e tomando mamadeira. Não quero decidir mais nada, o máximo que eu posso fazer é comprar e comprar e chorar quando escangalhar. Só uma última proposta: em vez de deputados e senadores, a gente devia eleger babás para ocupar o Congresso e a ONU e decidir os destinos da nação e do mundo.

E você é bem capaz de me perguntar: mas quem vai tomar conta dessa criançada? Quem vai gerir o mundo e a humanidade? Ah, sei lá, eu sou pequenininho, não me preocupo com isso não. Não quero mais saber de governantes. Aceito no máximo uma governanta. De preferência uma alemã peituda e mandona. Eu sou que nem o Peter Pan. E quero comer a Sininho. Escrever esse texto foi a última iniciativa que eu tomei na vida. Depois do ponto final eu não tenho mais opinião, só tenho vontade: eu quero! Eu quero! Eu quero! E pronto! Quero liberdade total, vou fazer cocô nas calças e ainda vou esfregar na parede! Não quero bolsa-família, não quero bolsa-escola, não quero cidadania. Tenho uma única reivindicação final, minha amiga: dá a chupeta pro bebê não chorar!


César Cardoso

Bom, Ruim, Assim, Assim...

Quer saber de uma coisa? Tudo pode ser bom, ruim e principalmente
assim assim
Tudo ao mesmo tempo ou não, e não necessariamente nessa ordem
Bom é chegar na praia à tardinha, anuncio de por de Sol, a água
de ondas mansinhas
Jogar bola na espuma e sob o céu encaixa como se fora Tafaréu.

É bom também quando começa a chover
E as gotas fazem cócegas na superfície do mar
Como se um cardume infinito prometesse matar a fome
De todo o Vidigal, Rocinha, Cidade de Deus e Vigário Geral.

Ruim é lembrar daquele amigo que de prancha na mão
Morreu de um beijo roubado de um raio, da lembrança a correria,

O medo... o medo... medo é bom, ruim é o medo de ter medo!

Bom voltar trocar chuva por chopp e passar atrás da pelada
A bola vai pra fora e como na crônica de Rubem Braga sobra pra
você
Que mata no peito faz embaixadinha e devolve redondo... num
chute perfeito
Ruim é a fisgada na coxa sair mancando disfarçadamente...
A vergonha de ta decadente não é ruim, ruim é o orgulho que se
nega a reconhecer a decadência.

É bom a cidade estranha em que você nunca esteve e sabe que
nunca mais vai voltar
E nesse lugar você tem uma obrigação sem graça que cumpre com
estilo e precisão
Traçando um dia perfeito no arco do tempo

Quando cai a noite é bom tomar um banho e sob o chuveiro é bom
sentir saudade,
Ruim é não ter saudade, e como é bom sair sem direção pelas ruas
da cidade
Pensando no que você fez da sua vida e no que a vida fez em você

Bom é sonhar, realizar não é tão bom, mas ruim mesmo é não
realizar

O fim de um grande amor é muito, muito ruim, um grande amor não
tem fim!
Bom é amar, ruim é amar... Bom é encarar a vida com fantasia.
Quando um poeta desaparece é bom colocar chapéu de Bogar que
tudo pode solucionar...
Ruim é encontrar o precipício, morrer não deve ser tão ruim
assim...
E pode ser bom falar sobre bom e ruim, e pode ser pior assim
assim ... bom!

Pedro Bial